escritor do mês: José Saramago

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Auto-retrato

Ilda
Vou tentar olhar para dentro de mim e fazer um auto-retrato com alguma fidedignidade. Tenho 15 anos, penso-me uma miúda como todas as outras da minha idade, em termos de gostos e de vivências. Fisicamente sou do tipo “baixinha”, magra - gosto de uma expressão da minha mãe, que me compara a um junco, esguia e flexível – tenho os cabelos castanhos claros e bastante compridos, os meus olhos são castanhos e expressivos. Gosto do meu aspecto físico. Gosto muito de sair com os meus amigos, de navegar nas redes sociais, gosto de escrever para o meu blog, adoro fazer compras ou mesmo apenas andar de loja em loja a ver com minúcia as novidades, a experimentar as roupas… e não gosto nada de tarefas domésticas, nem de ler. Áh e mais importante de tudo detesto cebola, odeio mesmo!!!
Agora cá dentro, e isso é o mais difícil, sei que tenho defeitos e virtudes, mas prefiro abordar as coisas de que tenho consciência como características, sem as classificar. Assim, posso dizer que sou sensível e que sempre que algo me toca ou incomoda faço o que estiver ao meu alcance para resolver. Sou rápida na tomada de decisões, mas, por vezes, torno-me irreflectida nesta rapidez. Sou muito alegre, tenho muita vivacidade, esta vivacidade, por vezes, escapa ao meu controlo em situações em que tal não devia acontece. Sou teimosa, a minha mãe diz que por vezes sou casmurra, ainda não consegui perceber muito bem se concordo com ela, mas é capaz de ter razão. Sou voluntariosa, algumas vezes é bom outras nem por isso. Acredito que sou consciente da realidade social, económica e política, sobretudo a que me diz directamente respeito. Verificando que o mundo está a atravessar um momento difícil, tenho esperança de conseguir contribuir para que melhore.
Em jeito de conclusão quero dizer que nem foi muito difícil olhar para dentro de mim, mas acho que fui benévola… de qualquer modo um auto-retrato falado é algo que não se pode considerar estático, como uma pintura, mas sim algo mutável tendo em conta as vivências que vou adquirir, o contexto social que vou encontrar e mesmo o meu crescimento moral e cognitivo. Por isso, atrevo-me a dizer que hei-de corrigir os defeitos e adquirir novas virtudes para completar as que já possuo, no fundo, quero crescer. 



Maria de Albuquerque

Folha em branco
Aos poucos sendo pintada
Com um conjunto de traços coloridos
O mar onde a imaginação nada,
Um furacão de ideias
Uma leve nuvem que ao sonho nos ata.
O mistério,
A interrogação no ar
Traços de um rosto
Pensamentos soltos
A mais delicada flor
A tempestade ao luar
Um grito. Um choro
Uma manhã solarenga de Verão
Cores, riscos,
O bater de um coração
Folha inacabada
Que acompanha o tempo.


Mariana Oliveira

Elaborar um auto-retrato é tarefa difícil. Não acho que haja muita gente que goste de falar de si próprio. Eu não sou excepção à regra. De qualquer modo, por vezes há um lado positivo em falarmos de nós, em nos apresentarmos, dizermos quem somos. Temos de reflectir bastante, e de certa forma isso ajuda-nos a perceber quem somos, a conhecer quais os nossos traços mais vincados, os mais brilhantes e aqueles que devemos melhorar.

Tenho apenas 160 cm e uns bons 15 anos de vida. Os meus cabelos longos escondem qualquer ponta de pensamentos inseguros que possa ter, no entanto, essas inseguranças são reflectidas nos meus olhos. Não estou inteiramente satisfeita com a minha aparência. Estará alguém? Queremos sempre ter algo que nos falta, por mais simples que seja, nunca estamos plenamente satisfeitos. Pelo menos, aceito-me, penso eu. Geralmente costumo dar uma primeira má impressão de mim que não corresponde à realidade, algo que não me agrada nada. De facto, irrita-me.
Considero-me, de certo modo, uma lutadora por todas as experiências de vida que tive e, que continuo a ter. Ainda me espera muito mais pela frente, o mundo adulto é muito cruel, mas sinto-me preparada. Tenho um orgulho bastante forte, mas quando sei que necessito de o baixar, faço-o. Gosto de ter controlo sobre as coisas, sobre a vida, não quero que nada me escape. Gosto de estar sozinha, mas não de me sentir sozinha.
Tenho uma faceta muito ambientalista, ecologista. Desde que vi um documentário, que realmente me chocou, preocupo-me muito com o nosso planeta. Acho extremamente engraçado quando toda a gente anda preocupada com as crises políticas, sociais e económicas e ninguém se lembra que estamos no meio de uma crise ambiental. Ninguém se lembra que necessitamos, para além de dinheiro, de um bom governo e de pessoas calmas e felizes, de uma casa. Essa casa chama-se Planeta Terra e sem ela ninguém aqui estaria.
Como não sou pessoa de me queixar, ser negativa ou derramar lágrimas, costumo, às vezes, expressar o que sinto no papel, ou então ouço uma boa dose de música. Sou genuína. Não previsível. Sensível, não lamechas. Sensível no facto de sentir mais do que os outros sentem, em certas situações, sair a mais magoada, a mais triste, mas isso porque sou a que mais ama, a que mais se dá. Sou verdadeira, comporto-me de maneira a mostrar o que sinto pelas pessoas. Compreensiva e racional. Trabalhadora e aplicada. Sou uma pessoa que gosta de agradar a todos e quando não consigo, vou-me abaixo. Sou forte psicologicamente. Um pouco ingénua, talvez.
Normalmente, tento prever o final da corrida em vez de estabelecer metas, o que não é bom, do meu ponto de vista. Sou muito ambiciosa e concentrada naquilo que quero. Tenho medo de desilusões - de não conseguir alcançar o que tanto anseio.
Sou preocupada. Tento dar o meu melhor como pessoa, mas ninguém é perfeito ou feito de aço e, como tal, tenho as minhas inseguranças, imperfeições e defeitos. Sei perfeitamente que, por vezes, falho.
Sou muito observadora e perspicaz, daí o meu fascínio por máquinas e, por vezes, aparente desconcentração. Gosto apenas de captar o que observo e assim poder lembrá-lo para sempre.



Guilherme Veríssimo

O meu nome é Guilherme Veríssimo,
Há quem diga que sou queridíssimo,

Há quem diga que não,
Normalmente o meu irmão

Quinze anos é a minha idade,
Sou magro e bonito,
É uma realidade

Cabelo aos caracóis e não gosto de mentirosos,
Tenho um metro e setenta e três,
E uns dentes horrorosos

A parte física já está, agora a psicológica,
A aparência é o menos,
Essa é a minha lógica

Pessoas desonestas e desleais,
São desprezáveis,
Infelizmente são reais,
Mas não têm valores viáveis

Nada mais a dizer de mim,
Sou desinteressante e não tenho culpa de ser assim.

Joana Rosa 

Sou alta, (demais para o meu gosto)
Tenho olhos castanhos
E quase sempre um
Sorriso no rosto.

Por vezes tenho as minhas crises,
Como toda a gente,
Nem todos os dias
Podem ser felizes.

Sou brincalhona
Um pouco criança até
Por vezes rio-me tanto
Que nem me aguento em pé.

Eu sou assim
E é assim que eu sou
Até hoje ainda
Só ele me mudou.

Alexandre

Loureiro (Alexandre), português só de nacionalidade, moreno, cabelo de esfregona castanho-escuro, ferrugem nos dentes, cerca de 1,80 m de uma ponta a outra, em bom estado mental e físico, apto para qualquer desafio. Destaca-se pela sua perícia em não saber jogar futebol e por não se poder queixar da sua vida, que lhe corre de feição. Largueirão e brincalhão, é verde de coração e apenas aspira chegar a um estado de “zen”, e por isso esforça-se por fazer o menos e dormir o mais possível, o que indica que pode ser passível de “preguicite aguda”. Ambiciona saber “fazer” música e não apenas tocar por tocar, sabendo que esse passeio pelo caminho alegre e espinhoso da musicalidade lhe roubará muito tempo e é incompatível com a sua “preguicite”. Alexandre tentará então suceder nos parágrafos mais próximos da sua vida para assim acabar o capítulo com que se depara.

Luana Silva

Tenho quinze anos,
Luana é o meu nome,
De olhos castanhos
E cor cabrita,
Procuro um mundo sem estranhos.

Estou com marcas na cara
Da cruel puberdade
Nem mesmo a base
Consegue tapar tamanha crueldade.

Quero liberdade,
Como uma criança quer idade
Porém preciso de ter responsabilidade.

Responsabilidades não quero ter,
Todavia sem elas não posso crescer.

Crescida já sou,
Só não sei ainda
Para onde vou.

Um caminho terei que escolher
Para no fim poder sobreviver,
Para não me arrepender
Comigo irá a minha cadela
Enquanto houver mortadela.

Não sei o que sou,
Não sei o que serei,
Sei apenas que um dia vencerei.

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ESCRITOR DO MÊS

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JOSÉ SARAMAGO

JOSÉ SARAMAGO

"A meio deste mês de Outubro será publicado, em Portugal e no Brasil, Claraboia, o romance que José Saramago escreveu antes de entrar num tempo de silêncio que durou quase 20 anos, e que, de alguma maneira, teve a sua origem na falta de respeito com que o autor se sentiu tratado. José Saramago, com 30 anos recém cumpridos, entregou o que supunha vir a ser o seu segundo romance a um amigo, com relações editoriais, que se encarregou de levá-lo a uma editora portuguesa. Que nunca o editou, decisão que Saramago poderia aceitar, mas nunca daquela forma, durante meses e anos não lhe responderam e, para além disso, não devolveram o original. Foi assim até quarenta anos depois, quando recebeu a insólita notícia de que “numa mudança de instalações se havia encontrado um manuscrito e que estariam muito interessados em publicar”. Saramago agradeceu a oferta mas, disse, já não é o momento, já passaram muitos anos. E não quis ver publicada Claraboiaem vida, ainda que tenha deixado escrito que os que lhe sobrevivessem poderia fazer o que pensassem conveniente.

E o conveniente é conhecer o primeiro Saramago, o que já era um grande escritor ainda que os meios de comunicação não falassem dele e as editoras recusassem os seus originais. A partir de Outubro, todos os leitores em português terão a possibilidade de desfrutar deste presente, desta pequena e madura jóia. Outros idiomas terão de esperar, ainda que talvez na primavera os leitores em castelhano, catalão e italiano, possam ter oportunidade de ter este livro de Saramago nas mãos, para aumentar a sua bagagem, para disfrutar com a grande literatura." josesaramago.org

Excerto
«Por entre os véus oscilantes que lhe povoavam o sono, Silvestre começou a ouvir rumores de loiça mexida e quase juraria que transluziam claridades pelas malhas largas dos véus. Ia aborrecer-se, mas percebeu, de repente, que estava acordando. Piscou os olhos repetidas vezes, bocejou e ficou imóvel, enquanto sentia o sono afastar-se devagar. Com um movimento rápido, sentou-se na cama. Espreguiçou-se, fazendo estalar rijamente as articulações dos braços. Por baixo da camisola, os músculos do dorso rolaram e estremeceram. Tinha o tronco forte, os braços grossos e duros, as omoplatas revestidas de músculos encordoados. Precisava desses músculos para o seu ofício de sapateiro. As mãos, tinha-as como petrificadas, a pela das palmas tão espessa que podia passar-se nela, sem sangrar, uma agulha enfiada.
Num movimento mais lento de rotação, deitou as pernas para fora da cama. As coxas magras e as rótulas tornadas brancas pela fricção das calças que lhe desbastavam os pelos entristeciam e desolavam profundamente Silvestre. Orgulhava-se do seu tronco, sem dúvida, mas tinha raiva das pernas, tão enfezadas que nem pareciam pertencer-lhe.
Contemplando com desalento os pés descalços assentes no tapete, Silvestre coçou a cabeça grisalha. Depois passou a mão pelo rosto, apalpou os ossos e a barba. De má vontade, levantou-se e deu alguns passos no quarto. Tinha uma figura algo quixotesca, empoleirado nas altas pernas como andas, em cuecas e camisola, a trunfa de cabelos manchados e sal-e-pimenta, o nariz grande e adunco, e aquele tronco poderoso que as pernas mal suportavam.
Procurou as calças e não deu com elas. Estendendo o pescoço para o lado da porta, gritou:
- Mariana! Eh, Mariana! Onde estão as minhas calças?
(Voz de dentro:)
- Já lá vai!
Pelo modo de andar, adivinhava-se que Mariana era gorda e que não poderia vir depressa. Silvestre teve de esperar um bom pedaço e esperou com paciência. A mulher apareceu à porta:
- Estão aqui.
Trazia as calças dobradas no braço direito, um braço mais gordo que as pernas de Silvestre. E acrescentou:
- Não sei que fazes aos botões das calças, que todas as semanas desaparecem. Estou a ver que tenho de passar a pregá-los com arame…
A voz de Mariana era tão gorda como a sua dona.»